domingo, 19 de setembro de 2010

O Beijo

CONSTANTIN BRANCUSI - O Beijo, 1908
Severas letras que arrancam de mim o riso
O fato, o é assim como o faço
O faço fato, prá que de mim não saia
Tão perto, me faz sentir
A lembrança que desvanece
Teu leite no meu leito,
teu gosto no meu rosto.
Tão sóbrios, nossos olhos se cruzam,
Tão longe, tão perto, tão tudo, tão nada.
Tua pele suada e a minha, ligadas num corpo só
O cheiro do prazer que atravessa por entre nós,
Nossos nós. Seu gemido, sua dor, seu favor.
Seu beijo na minha boca, sua boca, nosso beijo, nosso tudo.

sábado, 18 de setembro de 2010

Antes que o Mundo Acabe e 5xFavela

Noutro post, noutro dia, conclui uma reflexão que tratava do que me inicia nessa conversa, de agir sobre a nossa história, de decidir por nossas escolhas, de provocar com atitudes a nossa própria vida.
Invariavelmente, nos meus anos mais recentes, para não denominá-los últimos, tenho feito escolhas curiosas, que me trazem ganhos interessantes, deveras importantes também. Ano passado, para não ir muito longe, decide por ler muito, comecei e concluí meu ciclo com Saramago (A Viagem do Elefante e Caim), no meio desse soneto, vieram também biografias (Lance Armstrong e Maysa), uma trilogia de ficção evangélica mais dois bestsellers do mesmo tema, romances psicológicos, livros que viraram filme (como O Menino do Pijama Listrado), magia e fantasia (A Cabana e As 7 Crônicas de Nárnia). Num desejo de terminar o que havia começado, li até o que achei pouco estimulante, mas que, tomando a rédea de minhas escolhas, algo de bom poderia surgir, ainda que fosse terminar aquela leitura.
Bem, neste ano, o cinema tomou lugar neste ímpeto de fazer-me decidir e pensar, ocupar-me por vezes. E tudo isto, tem me levado a agradáveis surpresas. Como já tenho dito, o cinema francês foi de longe minha maior satisfação e descoberta. Filmes de qualidade, dramas ou comédias de fazer rir e chorar, de fazer pensar ou simplesmente descontrair, sem compromissos de compra e venda, sem verdades definitivas, sem promessas de solução mundial, sem o falso maniqueísmo moral defendido ainda por algumas estações cinematográficas.
Outras gratas surpresas dessas semanas passadas, foram estes lançamentos brasileirinhos, "Antes que o mundo acabe", uma produção gaúcha das mais belas. Um tom leve, suave, muito parecido com o também brasileiro e gaúcho "Os Famosos e os Duendes da Morte" (comentado num dos meus primeiros posts). O outro, é o "5x Favela, agora por nós mesmos", interessante por sua construção e história, o filme retrata em 5 curtas, histórias do mundo chamado FAVELA, contadas por quem vive lá. Intenso em suas provocações, instrui-nos num outro conceito moral, o conceito favelático. Respostas fáceis que, tem outro tom e rumo nas relações estabelecidas entre moradores, autoridades e o poder por lá e por cá estabelecido.
Dois filmes muito bons, que divergem num aspecto que torna o 5x Favela, um tantinho menos espetacular do que poderia ser. Ambos, recheados de novos atores, ou pelo menos, pouco conhecidos no mercado midiático, o 5x Favela não sustenta em suas boas histórias, boas interpretações. Atores que emocionam pouco, mas que nem por isso, torna o filme menos interessante, as histórias no fim das contas, se sobrepõe a tudo. Em compensação, "Antes que o mundo acabe" não fica devendo em nada, gente nova dando passos de gente grande...
Recomendo ambos, com ou sem pipoca.

sábado, 11 de setembro de 2010

ONDE VOCÊ ESTAVA EM 11 DE SETEMBRO DE 2001?


Nos últimos tempos tenho escrito pouco, se por falta de inspiração, não sei, se por falta de vocação, não sei, se por falta de devoção, não sei. Fato é que hoje me senti ambiguamente mobilizada a escrever. Seja pelo óbvio de tratar de um episódio que, neste novo século, é sem dúvida dos mais degradantes e marcantes. Seja pelo óbvio de tratar de um episódio que, aquém deste século, motivou um incontrolável desejo de vingança, matança, esperança e desesperança, que também toca nossos intocáveis instintos primitivos.
Certamente todos nós já respondemos por inúmeras vezes a pergunta título deste texto, e isto do mais profundo de nossas cavernas mentais, sai com uma satisfação imensa de conexão com a história, com esta humanidade, com a dor ou prazer alheios (que desastroso dizer isso!!!).
Avenida Paulista, tomando um lanche antes de encontrar com um grupo de adolescentes para uma visita cultural. Mas o que é aquilo na TV? O que está acontecendo? Nem dei conta da dimensão dos fatos. Hoje pergunto, porque não me aprofundei um tanto mais naquelas imagens que marcariam ainda mais meus minutos de vida daquele dia?... me lembraria ainda se houvesse conversado com alguém sobre aquilo, alguém que já conhecesse as tais torres e me contasse de sua viagem e seus passeios... me lembraria de alguém chorando por algum parente ou amigo imigrante que estivesse por lá... mas não, não me dei conta da dimensão do fato ... tornei meus minutos inglórios, tomei meu suco e fui embora .
Remida por não sermos nós os diretamente agredidos naquele dia, segui meu destino permitido a partir de então, sofrendo ou gozando sobre a dor do outro (novamente desastroso repetir isso!).
De tudo o que foi produzido e construído sobre este fato nestes 09 anos e, avidamente consumido por todos nós, quero falar desta imagem, que por incrível que pareça só vi ontem.
Conhecida como "O Homem em Queda", esta imagem já traz em seu título um roteiro, que é coletivo, mas que pode ser também muito particular. O que fundamentalmente está caindo? QUEM está, fundamentalmente caindo? Cair é bom ou mal? Que escolha é esta que este alguém teve que tomar?
As nossas identificações, manifestas e públicas, dão-se com personagens vitoriosos, bem- sucedidos, heróis, vencedores legítimos... pouco provavelmente com quem salta de um prédio para a morte. O que nos vem, o que me veio, foi de pronto... que desespero, que limite, que loucura, que horrível.
Mas, como transformar dor em benção não é humano, quiçá divino, transferi-me para um outro ponto de um outro olhar. Neste documentário que vi, a provável parente do homem que salta, "prefere" olhar com otimismo este salto. Diz ela em suas palavras, aqui rebuscadas (de re-buscar na memória) que ele poderia esperar a morte, ele poderia ficar parado e não decidir sobre sua vida e história. Poderia ficar lá e jamais ser encontrado, poderia ficar lá e ser mais um, ou menos um. No entanto, ele decidiu, ele saltou, ele agiu sobre sua escolha e vontade, ele agiu sobre sua vida. Talvez como muitos de nossos atos, saltar daquele prédio em chamas, foi um ato de coragem, de decisão, de escolha, de morte por certo, mas um ato, fundamentalmente de vida, por menos que isso possa parecer.
Como a irmã do moço, eu "prefiro" também enxergar isso, ao menos dessa vez, ao menos por hoje.

Créditos da Foto: fotojornalista Tom Junod